O pagamento de dividendos reduz o preço da ação?


Algumas pessoas acreditam que o pagamento de dividendos não é uma vantagem para o investidor em ações em razão do seguinte fato: o valor pago a título de dividendos é descontado do preço da ação. Por isso, a vantagem decorrente do pagamento dos dividendos seria anulada pelo desconto no preço da ação. A premissa de que o valor dos dividendos é descontado do preço da ação é correta, mas será que a conclusão de que não valeria a pena receber os proventos também é?


Por que os dividendos são descontados no preço da ação?
Antes de responder à pergunta, é importante compreender a razão de os dividendos serem descontados no preço da ação. Para explicar esse ponto, vou aproveitar uma metáfora bastante rural: imagine que você é um pecuarista e tem uma vaca que custa R$ 20.000,00. Alguns meses depois, seus empregados avisam que a vaca está prenha de um bezerrinho. Você concorda que, agora, o preço da vaca subiu um pouco? Afinal, o preço dela é composto pelo seu preço intrínseco (o preço da vaca), adicionado ao preço do bezerro. Se o bezerro custar R$ 3.000,00, isso significa que o preço do conjunto, agora, é R$ 23.000,00. No dia em que a vaca o parir, o bezerro será retirado dela e, com isso, o preço da vaca cai de R$ 23.000,00 para os R$ 20.000,00 originais.

O mesmo ocorre com os dividendos. Digamos que você tenha ações da Eletropaulo, cotadas a um valor de R$ 30,00 por ação. A empresa anuncia o pagamento de gordos dividendos no valor de R$ 3,00 por ação. No dia “com”, que é o último dia em que alguém deve ter ações da empresa para receber os dividendos. O dia seguinte é a data “ex” dividendos, a partir da qual alguém que investiu na empresa não tem mais direito a dividendos. Essa data equivale ao dia do nascimento do bezerrinho; como os dividendos não serão pagos para ninguém mais além dos que tinham ações da companhia no dia anterior, os dividendos são descontados do preço da ação. Como a ação estava cotada a R$ 30,00 e os dividendos correspondiam a R$ 3,00, a ação agora passou a ser negociada a R$ 27,00.


Os dividendos não determinam, sozinhos, o preço das ações



Obviamente, esse é um modelo simplificado. Pode ocorrer de a vaca ser de um raça que, subitamente, começou a ser muito valorizada pelos fazendeiros da região, o que a levou a ser cobiçada. Com isso, a demanda por vacas daquela raça aumenta e, por essa razão, o seu preço, na gestação do bezerrinho, sobe para R$ 30.000,00. Se o bezerro passar a custar R$ 4.000,00, isso significa que, após o parto, a vaca valerá R$ 26.000,00 (os R$ 30.000,00 menos os R$ 4.000,00 que o bezerro vale).

Por que trabalhei com essa hipótese da valorização? Pelo simples fato de que isso também ocorre no mercado de ações, o que atenua bastante o efeito do desconto dos dividendos no preço da ação. Voltemos ao exemplo anterior. Os preços das ações não são estáveis, como suposto naquele exemplo: no dia em que a empresa anuncia os dividendos, é possível que o mercado goste da notícia e o preço das ações sobe um pouco, de R$ 30,00 até R$ 32,00 na data “com”. No dia seguinte, a data “ex” dividendos, é feito o ajuste e a cotação cai de R$ 32,00 para R$ 29,00, abatendo-se os R$ 3,00 a título de dividendos.

Note que, nesse exemplo, o investidor ganhou R$ 3,00 em dividendos e perdeu R$ 1,00 na cotação da ação. Ou seja, ao contrário do que algumas pessoas supõem, o pagamento dos dividendos não empatou com a desvalorização da ação, mas garantiu lucros reais para o proprietário das ações da Eletropaulo.

O longo prazo anula o efeito do desconto dos dividendos no preço da ação


A rigor, o desconto dos dividendos na cotação das ações de uma determinada empresa só afeta o bolso dos traders, que negociam ações no curtíssimo prazo. E, mesmo assim, esse efeito só é percebido nas ações de empresas menos líquidas. No caso de empresas mais líquidas, que são mais negociadas, esse efeito é menos perceptível. Se a Vale pagar R$ 0,30 em dividendos e o preço de sua ação cair de R$ 42,00 para R$ 41,70, é bem possível que, se o mercado estiver otimista, no minuto seguinte os preços já voltem para a faixa dos R$ 42,00. A rigor o preço de uma ação depende das forças de mercado: se houver o desconto dos dividendos, mas o mercado continuar a negociar as ações da Vale a R$ 42,00, praticamente ninguém perceberá que houve o valor dos dividendos foi descontado.

Para pegar um exemplo real: no dia 11/08/2011, foi o dia “com” de dividendos pagos pela VALE5. Naquela data, o preço da ação estava em R$ 40,15. No dia seguinte (o dia “ex”), a ação estava cotada a R$ 39,16, ou seja, R$ 0,99 abaixo da cotação do dia anterior. A queda foi ainda superior ao valor pago a título de dividendos, de R$ 0,9334 por ação. Para o investidor de curto prazo, portanto, o desconto significou um prejuízo de 2,5%. Mas quem teve paciência para esperar um pouquinho viu o preço chegar a R$ 40,99 no dia 01/09/2011, mais do que o suficiente para “compensar” o desconto.

Portanto, é simplório o argumento de que o pagamento dos dividendos anula os ganhos de quem os recebe em razão desse desconto. Esse argumento pressupõe que a empresa é estática e que seus lucros irão permanecer “parados” ao longo do tempo. Mas, no caso de empresas que mantém um crescimento razoável por anos a fio, esse raciocínio simplesmente não se aplica, porque o crescimento nos lucros (e, consequentemente, dos dividendos) mais do que compensará o efeito do desconto.

Fonte: Finanças pessais